Enunciação e Acontecimento: Um breve Percurso Teórico Sobre a Constituição dos Sentidos

Artigo disponível em: http://www.discursividade.cepad.net.br/EDICOES/09/09.htm

Rosimar Regina Rodrigues de Oliveira

Ana Cláudia Fernandes Ferreira

Carolina de Paula Machado

Elizete Azambuja

Organizadoras

Este número da Web-Revista Discursividade, que centra suas discussões nos estudos da linguagem, tem como objetivo homenagear o professor e pesquisador Eduardo Roberto Junqueira Guimarães, especialmente por sua dedicação à pesquisa, que culminou no desenvolvimento da Semântica Histórica da Enunciação ou Semântica do Acontecimento.

A maioria dos trabalhos aqui reunidos foi escrita por alguns de seus orientandos, ex-orientandos, autores de diferentes gerações, diferentes caminhos e diferentes histórias, ou por pessoas que querem homenagear o professor Eduardo Guimarães por seu brilhante trabalho. Esses professores realizam suas pesquisas em diferentes instituições de vários lugares do Brasil, sendo esta reunião de artigos uma pequena amostra dos sentimentos de gratidão e admiração ao professor Eduardo Guimarães, por sua dedicação à pesquisa e/ou seu trabalho como orientador.

Os trabalhos produzidos por Eduardo Guimarães, na Semântica da Enunciação, fornecem um aparato teórico e metodológico constituído por conceitos capazes de descrever e interpretar os sentidos não de maneira estática, mas na sua constituição, no seu movimento. Nessa perspectiva, resultaram em um estudo da linguagem não apenas em sua estrutura, mas em seu caráter histórico-social e político.

Dentre os conceitos que fazem parte deste quadro teórico, temos o de acontecimento  que, atrelado ao de enunciação, dá a dimensão histórica da constituição dos sentidos. Através do conceito de memorável, Eduardo Guimarães considera também o presente e o futuro de interpretação. A noção de cena enunciativa, conforme estabelecida por ele, possibilita observar o sujeito, nas formas de locutor e enunciador, na relação com outros sujeitos e com as línguas que falam e que os constituem, o que nos leva a observar a linguagem por um viés político. Do ponto de vista analítico, há muitos conceitos que compõem a teoria desenvolvida por Eduardo Guimarães, dentre os quais destacamos o de reescritura e o de articulação, além do conceito de domínio semântico de determinação (DSD). Os primeiros possibilitam que se tome o enunciado, não isoladamente ou como um processo somatório, mas enquanto lugar de observação da palavra em relação ao texto. O último permite vislumbrar a designação de uma palavra em um texto e compreender os seus sentidos e a forma como eles significam algo do real. Isso contribui, em certa medida, para a leitura de uma história a partir do que as palavras significam em um texto.  Esta é uma pequena parte das suas contribuições para o desenvolvimento dos nos estudos semântico-enunciativos e argumentativos que abriram/abrem caminho para uma semântica que observa os sentidos nas diferentes práticas de linguagem.

As obras publicadas por Eduardo Guimarães são referências importantes para aqueles que se encontram no terreno movediço dos sentidos. Em Texto e argumentação, de 1983, ele já refletia sobre o lugar dos locutores na orientação argumentativa dos textos. No livro Os limites do sentido (1995), o autor situa a Semântica Histórica da Enunciação dentre os estudos semânticos desenvolvidos, de maneira a estabelecer a ponte com a história entendida como memória, enquanto na obra Semântica do Acontecimento (2002), a relação da enunciação com o conceito de acontecimento é redefinida e são dados os conceitos que permitem a manipulação analítica dos sentidos. Além dessas obras, há diversos outros artigos e livros, alguns deles organizados com outros autores e que contribuíram para tecer o percurso de sua teoria, sendo o livro Análise de Texto: procedimentos, análises, ensino (2011) o mais recente.

Nesta homenagem, destacamos o professor Eduardo Guimarães através de sua produção como semanticista. Mas não podemos deixar de mencionar também outras atividades de sua vida profissional, pois elas estão profundamente ligadas à sua reflexão intelectual.

Formado em Letras na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Santo Tomás de Aquino, de Uberaba, fez sua pós-graduação na USP, onde começou suas pesquisas em semântica. Tanto sua dissertação de mestrado (1976), como sua tese de doutorado (1979) tinham como centro de interesse o estudo da enunciação. A sua carreira como docente universitário começou na Faculdade de Letras Santo Tomás de Aquino. Lá lecionou de 1970 até 1972. Também foi professor da PUC de Campinas de 1979 a 1983 e é professor e pesquisador do IEL/Unicamp desde 1981.

Além de todas essas atividades, Eduardo Guimarães foi presidente do GEL, da ANPOLL, Diretor Executivo da Editora da Unicamp, Diretor do IEL e assessor especial do Reitor da Unicamp. Atualmente é conselheiro da Abralin e Coordenador do Labeurb/Unicamp.

Professor, orientador, autor, pesquisador, cientista, literato, editor, diretor, conselheiro… São muitos os cargos, funções e lugares que Eduardo Guimarães vem ocupando em sua vida acadêmica e que mostram a produtividade e a versatilidade do seu percurso profissional.

Assim, sua atuação, nas mais diversas esferas institucionais, proporciona uma dimensão do modo como ele se coloca politicamente diante da produção de conhecimento, que não pode estar isolado das instituições que sustentam esse conhecimento, da sociedade e da história. Ao mesmo tempo, este modo de trabalhar está indissociavelmente ligado ao seu percurso teórico e analítico no domínio da Semântica da Enunciação.

Enfim, Eduardo Guimarães faz esse percurso de teoria e análise de forma admirável. Em suas obras, aulas, conferências, conversas, reflexões consegue sempre capturar algum detalhe, muitas vezes, imperceptível a outros olhares, dando-lhe outra dimensão. E aí está uma característica essencial de seus estudos sobre a significação, que nos mostra como uma palavra de um enunciado se divide em tantos sentidos, em tanta história.

Campo Grande-Ms, Janeiro de 2012.

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ARGUMENTAÇÃO E RELAÇÃO ENTRE LÍNGUAS: PROCEDIMENTOS DE REESCRITURAÇÃO NO SITE “CIENTISTAS ASSOCIADOS”

Eleonora Bambozzi Bottura

Iniciação Científica, agosto de 2011

Esta pesquisa possui como motivação inicial o trabalho realizado entre os anos de 2009 e 2010 com o projeto-pesquisa “Argumentação e relação entre línguas em websites no espaço enunciativo de São Carlos” também financiado pelo CNPq e sob orientação da Professora Doutora Soeli Maria Schreiber da Silva do Departamento de Letras da Universidade Federal de São Carlos, UFSCar. No trabalho em questão, mobilizando, sobretudo, os debates referentes à Política de Línguas na atualidade e espaço enunciativo da Internet desenvolvemos significativas contribuições sobre relação entre línguas e espaços de enunciação no escopo de uma Semântica Histórica da Enunciação, a luz da Semântica do Acontecimento (GUIMARÃES, 2002). Vislumbrou-se, então, a possibilidade de se aprofundar nos estudos a partir dos procedimentos de reescrituração com o intuito de desenvolve-los para contribuir com novas reflexões, e de investigar de que maneira o histórico é mobilizado nesse espaço enunciativo da Internet. Para tanto, desenvolvemos leituras acerca do ciberespaço a fim de elucidar como consideramos mundo/ língua/ falante em uma relação que não é natural, mas política.

Portanto, esta pesquisa se dedica ao estudo da Argumentação por via aberta Ducrot e Anscombre tal como proposto por Guimarães em “Texto e Argumentação” ,  levando em conta a textualidade. A partir disso, busca-se refletir e analisar como as línguas funcionam no site e, também, o modo como as mesmas estão sendo distribuídas desigualmente aos seus falantes. Faz-se necessário salientar que o estudo foi concebido através da consideração do site “Cientistas Associados”  como acontecimento enunciativo o que permite a análise semântica da relação língua/ falante nos pressupostos da Semântica do Acontecimento, em que o falante caracteriza-se determinado pela língua que fala, já que se compreende língua enquanto perpassada e constituída, o qual político que se distingue por estabelecer em/ na língua um conflito entre: divisão desigual do real e afirmação de pertencimento dos não incluídos na busca de uma afirmação de um todos homogêneo. Assim, entende-se o falante como Locutor (L/l-x) submetido numa teia de efeitos de sentido regulado a dizer de um modo específico e que devido às perspectivas históricas tomadas – Enunciadores – irão configurar o agenciamento enunciativo, o qual evidencia a maneira das línguas funcionarem no site. Isso se dá por meio da configuração do agenciamento político do espaço enunciativo do mesmo em que são analisados os modos dos lugares de dizer e movimento de apagamento do histórico na Internet, caracterizada, sobretudo, por ser um espaço regulado – político – de distribuição das línguas aos seus falantes. Nesse sentido, esta pesquisa propõe o estudo da textualidade no site através do desenvolvimento dos procedimentos de reescrituração e da concepção de texto para a Semântica do Acontecimento. Para tanto, as cenas enunciativas – os links do site – serão analisadas por meio dos procedimentos semânticos de reescrituração a fim de propor um modo de se analisar texto na internet e de evidenciar a maneira como uma enunciação só adquire sentido em relação a outras, ou seja, a significação não está para uma segmentalidade da frase, mas para uma movimentação própria do site que conduz para diferentes pontos em um clique que determinará o outro e assim por diante. Desse modo, objetiva-se uma análise utilizando os procedimentos semânticos supracitados aliados à relação entre línguas e ao espaço de enunciação que se insere, por meio da análise do funcionamento do movimento integrativo do site o qual determina e constitui um ao outro culminando num texto que transita e compõe-se em cliques que embora não sejam finitos, funcionam enunciativamente por um efeito de unicidade. Com isso, pretende-se propiciar uma reflexão que desenvolva os procedimentos semânticos de análise e que colabore não só aos estudos da Semântica do Acontecimento, mas também aos estudos da linguagem.

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“La dictadura en la escuela. Las versiones para niños de la historia reciente.” Tradução nossa: A ditadura na escola. As versões para as crianças da história recente

Realização:

UEHPOSOL – Unidade de Pesquisa em Estudos Históricos, Políticos e Sociais da Linguagem. Bacharelado em Linguística; Departamento de Letras

Programa de Pós-graduação em lingüística -PPGL

Apoio: Departamento de Letras

13/11/2014

Resumo da Conferência (abaixo, o resumo está traduzido para o portugués)

 

La dictadura en la escuela. Las versiones para niños de la historia reciente. 

A partir de la promulgación de la Ley Nacional de Educación, en el año 2006, los sucesos ocurridos durante la última dictadura cívico-militar argentina pasaron a formar parte de la currícula del nivel primario y secundario a nivel nacional. Más allá de la actitud de muchos docentes que, durante todos los años previos habían insistido en traer esos acontecimientos al aula, el hecho de convertirlos en contenido obligatorio nos plantea una serie de interrogantes: ¿Qué reconstrucción de un período tan traumático de la historia argentina explicar a los niños más pequeños? ¿Qué esperamos que recuerden -ahora y cuando sean adultos- respecto de este período de la historia? ¿Es posible que versiones diferentes de los hechos convivan de manera no conflictiva? ¿Qué papel le corresponde a la escuela en ese debate? Para responder al menos a una parte de estos interrogantes, presentamos el análisis de dos materiales diferentes, provenientes de dos campos diferentes del Dispositivo Pedagógico: el campo oficial y el campo pedagógico (Bernstein, 1996). El análisis comparativo se articula en dos ejes: en primer lugar, el eje del diseño y de la organización de la información en los textos desde el cual abordamos los aspectos gráficos monomodales y multimodales (Kress y van Leeuwen, 1996) de los materiales trabajados así como también el ordenamiento global de la información (Van Dijk, 1983); en segundo lugar, el eje de los lugares enunciativos desde el cual se analiza la construcción del/los locutor/es y enunciador/es y sus respectivos alocutarios/destinatarios (Ducrot, 1984) así como también los desdoblamientos en la destinación según la conceptualización de E. Verón (1987). En términos generales, podemos afirmar que las diferencias halladas no hacen más que reproducir –al menos en parte- las diferencias que aún se discuten en el ámbito de la política a nivel nacional. El debate no está cerrado y no se trata, aún, de un problema historiográfico.

Dra. Julia Zullo

A ditadura na escola. As versões para crianças da história recente.

 

A partir da promulgação da Lei Nacional da Educação, no ano de 2006, os eventos ocorridos durante a última ditadura civil-militar argentina passaram a formar parte do currículo de nível primário e secundário no âmbito nacional. Mas além da atitude de muitos docentes que, durante todos os anos prévios haviam insistido em trazer esses acontecimentos para a aula, o feito de convertê-los em conteúdo obrigatório nos coloca uma série de interrogações: Que reconstrução de um período tão traumático da história argentina explicar às crianças menores? Que esperamos que recordem- agora e quando forem adultos- a respeito deste período da história? É possível que versões diferentes dos feitos convivam de maneira não conflitiva? Que papel corresponde à escola nesse debate? Para responder ao menos a uma parte destas questões, apresentamos a análise de materiais diferentes do Dispositivo Pedagógico: o campo oficial e o campo pedagógico (Bernstei, 1996). A análise comparativa se articula em dois eixos: em primeiro lugar, o eixo do desenho e da organização da informação nos textos do qual abordamos os aspectos gráficos monomodais e multimodais (Kress y van Leeuwen, 1996) dos materiais trabalhados  assim como também o ordenamento global da informação (Van Dijk, 1983); em segundo lugar, o eixo dos lugares enunciativos do qual se analisa a construção de(os) locutor(es) e enunciador(es) e seus respectivos alocutários/destinatários (Ducrot, 1984) assim como também os desdobramentos na destinação segundo a conceitualização de E. Véron (1987). Em termos gerais, podemos falar que as diferenças encontradas não fazem mais do que reproduzir- ao menos em parte- as diferenças que ainda se discutem no âmbito da política nacional. O debate não está fechado e não se trata, ainda,  de um problema historiográfico.

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